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Nasce Ketamyna, a 1500ª Waimiri Atroari : “Digam ao mundo que vivemos”

Nasceu Ketamyna Atroari, a milésima quingentésima índia da comunidade Waimiri Atroari, que vive na divisa dos estados do Amazonas e Roraima, próxima ao lago da usina hidrelétrica Balbina. Com quatro quilos e 49 centímetros, a pequena Ketamyna (pronuncia-se quetamuná) é uma prova de vida para um povo que, em 1988, somava apenas 374 indivíduos. Ketamyna nasceu no dia 4 de novembro, na Aldeia Paryry (pronuncia-se paruru).

Os Waimiri Atroari sobreviveram à extinção – morriam em média 20% ao ano e hoje têm taxa de natalidade de 6% ao ano – graças ao programa Waimiri Atroari, implementado pela Eletrobras Eletronorte, em parceria com a Funai,  sob a orientação do indigenista Porfírio Carvalho. Segundo ele, “os índios estão todos muito bem, vivendo em suas terras sem invasores, sem perturbação, de acordo com sua cultura”.

Mas nem sempre foi assim. “Em 1986 reencontrei os Waimiri numa situação muito difícil. Estavam doentes, tristes, perambulando pela rodovia BR-174, pedindo carona a caminhoneiros, dependentes de alimentação e doações. Morriam, em média, 20% ao ano. Podia-se dizer que estavam caminhando para o extermínio. Aquele povo que conheci em 1969, guerreiros altivos, defensores do seu território e de suas vidas, estava triste, aguardando algo que não sabia exatamente o que era. Ainda não havia demarcação nem definição dos limites de suas terras”, explica o indigenista da Eletrobras Eletronorte.

Reconhecido como referência mundial, o Programa inspira políticas públicas, investe na valorização étnica e faz a diferença na história das comunidades indígenas da Amazônia.Homens, mulheres, crianças e idosos caminham saudáveis pelas aldeias onde a comida é farta e, o sistema de organização social, uma aula de cidadania. Tudo por meio do programa idealizado para compensar os impactos provocados pelo alagamento de 30 mil hectares das terras indígenas – hoje demarcadas em 2.585.911 ha – pela hidrelétrica Balbina.

Um dos principais fatores responsáveis pelo crescimento populacional desses índios é o subprograma de saúde. O objetivo é garantir boas condições de vida à população Waimiri Atroari, valorizar a medicina tradicional e repassar conhecimentos das outras formas de medicina. Na reserva existem 19 postos de saúde e oito laboratórios. As atividades são realizadas por uma médica, enfermeiras, odontólogas, 18 agentes técnicos, um motorista, com o apoio de 39 agentes técnicos de saúde e 12 laboratoristas indígenas. No início todos os laboratoristas eram brancos, mas depois os primeiros Waimiri foram sendo treinados e repassaram os conhecimentos para outras pessoas da comunidade. Hoje são 12 escolhidos pelo povo.

Na educação não é diferente. O método é único no mundo, desenvolvido exclusivamente para eles. Primeiro, aprendem a escrever na língua própria e, quando já estão interpretando a escrita, começam a aprender o português e a matemática. São bilíngües. As aulas não se limitam à escola, mas podem ser explorados outros espaços como recurso didático, a exemplo de caçadas, pescarias, construção de malocas. São 19 escolas, 54 professores Waimiri Atroari e sete não-índios que auxiliam em disciplinas como ciências, geografia e matemática. No início do Programa não havia professores da etnia, o que foi acontecendo com a realização de cursos de capacitação e formação.

As aldeias Waimiri Atroari impressionam pelo tamanho, pela limpeza e magnitude das malocas. Em breve uma delas receberá a festa de comemoração pelo nascimento de Ketamyna Atroari e, durante dias, eles cantarão, dançarão e beberão uma de suas originais preparações culinárias, o mingau de buriti. O coco do buriti é coletado na mata, triturado e misturado à tapioca. Na cozinha, as mulheres também preparam peixes, caças e mingau de banana. Os Waimiri Atroari não consomem álcool nem qualquer outro tipo de droga.

Em 2003, nas festividades do nascimento do 1000º Waimiri, o cacique Mario Pawere comemorou o fim da ameaça de extinção, saudou os convidados brancos e deixou o recado dos Waimiri Atroari : “Digam ao mundo que vivemos!”

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